5 a 7 abril de 2024

Boticas, Vila Real

Convocatória

A nona edição do Encontro Nacional pela Justiça Climática surge numa altura fundamental da luta do movimento pela justiça climática em Portugal. Movimentos de diversas regiões do país convergem para Boticas, em Vila Real, uma região marcada pelo vigoroso protesto popular contra a exploração mineira. A localidade surge assim como o cenário ideal para debatermos as prioridades essenciais, para 2024, do movimento pela justiça climática.

Neste Encontro Nacional, serão destacadas e debatidas as questões fundamentais que delinearão o caminho conjunto dos coletivos e das pessoas. Este Encontro baseia-se na imprescindibilidade de uma transição energética justa, alinhada com os prazos ditados pela ciência climática, que não sacrifique comunidades em prol de interesses corporativos; na necessidade premente de responsabilizar os grandes emissores e os representantes políticos que os defendem, e de assegurar que a transição energética não aprofunda a crise social e económica, cimentando as diferenças sociais e económicas entre as pessoas. Em vez disso, propomo-nos a enfrentar as causas estruturais desta crise – um sistema baseado no crescimento constante em prol dos lucros e dos interesses do capital.

Da compreensão da intrincada relação entre o clima e o oceano, ao combate à pobreza energética, à urgência de promover soluções de mobilidade sustentável e pública nas nossas comunidades, ao imperativo de abandonar de vez os combustíveis fósseis e atingir a neutralidade carbónica até 2030 até à necessidade de fomentar a capacitar a participação pública informada em todos os pontos da discussão, todos estes aspetos serão imperativos para moldar um presente e futuro mais justos e sustentáveis.

Esta edição surge numa altura fundamental na luta do movimento por justiça climática em Portugal, porque a emergência climática não é apenas uma questão ambiental; afeta todos os aspetos da nossa vida. Contudo, continuamos a confrontar-nos com políticas públicas pouco ambiciosas e comunidades cada vez mais vulneráveis. O falhanço institucional e governamental deixa clara a necessidade da organização e resistência e de ação popular e cidadã organizada para travar o caos climático e social a que o atual sistema nos condena.

Este Encontro Nacional não é apenas um fórum de debate, mas um espaço de ação concreta, onde traçaremos estratégias e sinergias para enfrentar os desafios climáticos com determinação, justiça e solidariedade.

Ao reunirmo-nos em Boticas, reafirmamos o nosso compromisso com a construção de um mundo onde a equidade e a justiça ambiental sejam prioridades inegociáveis. Este Encontro será um ponto de passagem para uma transformação profunda nas nossas sociedades, onde o bem-estar das pessoas e do planeta estão no centro das todas as ações e decisões.

Organizadores

Organização:

  • Associação de Combate à Precariedade – Precários Inflexíveis
  • Climáximo
  • Empregos para o Clima
  • Montalegre Com Vida
  • MUBi
  • OIKOS
  • Quercus
  • Sciaena
  • Último Recurso
  • UMAR
  • Unidos em Defesa de Covas do Barroso
  • XR Portugal
  • ZERO

Apoio:

  • Associação Dunas Livres
  • Associação Unidos pela Natureza
  • Coopérnico
  • Ecomood Portugal
  • GEOTA
  • GPSA – Preservação da Serra da Argemela
  • Instituto Marquês Valle Flor
  • MiningWatch Portugal/Observatório Ibérico da Mineração
  • Movimento SOS Serra d’Arga
  • Povo e Natureza do Barroso
  • Reboot
  • Rede para o Decrescimento
  • Scientist Rebellion Portugal
  • TROCA – Plataforma por um Comércio Internacional Justo
  • Veredas da Estrela
  • Youth Climate Leaders

Programa

Resumo do Plenário Final

No dia 5 de abril, foi realizada a abertura oficial do 9º Encontro Nacional pela Justiça Climática com a tertúlia “Transição ou expansão energética? Um olhar crítico sobre as políticas de descarbonização a partir dos projetos de mineração no Barroso”. Várias perspetivas distintas convergiram para a conclusão de que a mineração não é bem-vinda, nem no Barroso, nem em qualquer outro local. Defendemos uma visão abrangente de que os projetos de transição que não levam em consideração aspetos sociais, económicos e ambientais com transparência e participação pública são meras falácias. É imperativo repensar um novo sistema que não explore as pessoas nem o planeta.

No dia 6, durante as sessões da manhã, foram debatidos temas relacionados com transporte, enfatizando a importância da transição na área da mobilidade. Destacou-se que este sector é responsável pela maior parte das emissões de gases de efeito de estufa em Portugal, podendo, contudo, gerar milhares de empregos e absorver trabalhadores de indústrias poluentes. Além disso, salientou-se o potencial para impactos positivos no bem-estar das populações, podendo mobilizar a população em prol de uma transição justa.

Na sessão sobre oceano, clima e mineração da Sciaena foram apresentados os serviços prestados pelo oceano ao planeta, desde a redução da temperatura (17ºC), à fixação (1/3) de carbono de origem humana e à produção de metade do oxigénio produzido na Terra. Destacou-se também a importância do oceano na luta contra as alterações climáticas.

Na sessão sobre ameaças ao solo e biodiversidade do GEOTA foram mencionadas e discutidas cinco grandes ameaças: mega centrais fotovoltaicas, agricultura intensiva e de regadio, construção de grandes barragens, construção em grande escala e projetos ferroviários de alta velocidade.

A sessão da Ferrovia Ibérica e intermodalidade da MUBi, ZERO e Aliança Ibérica de Caminhos de Ferro abordou a realidade, desafios e exemplos da intermodalidade em Portugal. Foi partilhada a experiência da viagem intermodal feita para este ENJC desde Lisboa até Boticas, sendo o último trecho realizado de bicicleta. A ZERO ampliou o tema da intermodalidade e ferrovia, partilhando um projeto cujo objetivo é que, em 2030, a ferrovia seja o principal meio de transporte a nível mundial. Por fim, a Aliança Ibérica de Caminhos de Ferro apresentou as fragilidades do modelo atual e delineou um plano concreto para tornar a mobilidade transfronteiriça num serviço integrado que afeta 6,5 milhões de pessoas na região Norte de Portugal-Galiza.

O painel da Último Recurso sobre “Litigância climática: a solução para as minas de lítio” mostrou como, através do Direito, querem responsabilizar os verdadeiros responsáveis pela crise climática. Para isso, usam o método inovador da litigância climática em Portugal. A sessão focou-se a seguir na especificidade jurídica dos regimes e leis que regulam a extração de recursos minerais, dando assim um enquadramento legal da extração de lítio em Portugal. Por fim, a sessão propôs uma ação embrionária de processar o Estado português através de uma “ação popular” para travar o projeto de mineração de lítio no Barroso.

Na sessão “O papel das comunidades de energia renovável no quadro da transição para uma democracia energética justa” da Coopérnico, foi destacada a importância dessas comunidades no desenvolvimento de uma visão de energia descentralizada, onde os próprios cidadãos têm um papel ativo na produção e distribuição de energia limpa, com casos de sucesso em Portugal e quais são as limitações e as soluções que as comunidades de energia oferecem.

Na sessão “O olhar ecofeminista na transição climática” foram apresentadas visões particulares. Desde abordagens que colocam em destaque o machismo e o tratamento das mulheres na sociedade até reflexões sobre as visões polarizadas, a discussão e participação do público foi rica em intervenções pertinentes com opiniões críticas. A ideia de unir, em vez de separar, foi enfatizada como um caminho mais eficaz para o progresso. Além disso, ressaltou-se a importância da empatia e do cuidado, valores que transcendem quaisquer diferenças e se mostram fundamentais na construção de um futuro mais sustentável e equitativo.

“Em estado de emergência, o que fazer?” foi o título da sessão do Climáximo e da GCE. Nesta sessão, o Climáximo e a GCE apresentaram o enquadramento do estado de emergência climática que tem estado na base das estratégias dos coletivos. A sessão teve foco no significado de estar em Estado de Emergência para cada uma de nós. Para elas, como explicaram, tem significado tomarem novos riscos individuais e coletivos, ancorados na necessidade real de travar a crise climática e do movimento ter de planos honestos e sérios para como implementar justiça climática. Agir em conformidade com o estado em que estamos não é delegável, é responsabilidade de cada uma de nós.

Na sessão “Prioridades do movimento climático”, a Quercus falou da necessidade de construir uma cultura regenerativa e fazer uma transição alimentar. Foram dadas sugestões de carácter mais pessoal como fazer uma mini-horta e mudar para uma alimentação de base vegetal. Falou-se da necessidade de voltarmos a conectar-nos com o território e sobre prestar atenção à ligação entre corpo e mente.

A sessão promovida pelas Dunas Livres, uma associação e plataforma de defesa das últimas dunas selvagens da Europa, contou com uma tertúlia sobre a coesão em grupos de trabalho voluntário nas ONGA e na conceção de um novo Plano de Turismo, com vista à promoção dos habitats costeiros e litorais. A segunda parte da sessão contou com um momento musical participativo, de união entre a arte, saúde mental e ativismo.

Para concluir, as Assembleias Cidadãs, trazidas pelo XR, emergiram como ferramentas fundamentais para promover mudanças sistémicas. A sessão começou com uma apresentação do XR, destacando a necessidade de um novo sistema capaz de resolver o que o atual não consegue. As Assembleias de Cidadãos surgem como uma proposta para abordar questões como a redução de emissões. O XR fundamenta-se em princípios como ação direta, desobediência civil, cultura regenerativa e inclusividade radical. Em seguida, foi feita uma caracterização da situação atual, destacando o pico do consumo energético e material, e o iminente colapso, fascismo e guerra. A sociedade está assente num modelo insustentável que pode resultar num planeta inabitável.